domingo, 10 de setembro de 2017

O dia seguinte: o que vem depois que a editora resolve publicar seu livro


A primeira vez que fechei um livro com uma editora foi bem engraçada. Eu fui dormir tarde no dia anterior e acordei cedo com o telefonema. Do outro lado da linha estava o meu primeiro editor. Só que eu, claro, não acreditei. Estava tão sonado que pensei ser brincadeira de algum amigo sem noção.
 
– Alexandre? Aqui é da editora RHJ. Recebemos três originais seus e queremos publicar dois deles.
– Hâ? Tá. Sei. Que originais? – enrolei enquanto tentava identificar a voz do filho da mãe.
– Pensamos em lançar “O Julgamento do Chocolate” no ano que vem e…
– O quê? Maravilha!

Foi só então que eu vi que não era pegadinha. Ninguém sabia os nomes das minhas histórias. Acordei na hora. E fiquei sorrindo pelo resto da semana.

Mas esse artigo não é para falar sobre isso e sim sobre o que acontece depois.

Em um mundo perfeito, o escritor receberia o contrato em poucas semanas. O contrato de edição em língua portuguesa garantiria a publicação em até dois anos e daria 10% do valor da venda do livro para o autor do texto. Se o livro fosse vendido em e-book, os ganhos subiriam para 20% (pelo menos). O escritor poderia indicar um ilustrador (a decisão final seria sempre do editor, mas este ao menos pensaria em convidar o ilustrador indicado) e receberia com antecedência o texto revisado com algumas alterações sugeridas, além dos rascunhos das ilustrações, para aprovação. Depois aguardaria sua cota de livros em casa, teria o livro inscrito pela editora em programas de compras de governo, participaria de encontros e entrevistas marcadas pelo departamento de marketing da editora e receberia seus direitos autorais nas datas estipuladas em contrato e relatórios de vendas detalhados.

Nada disso é impossível acontecer. Alguns editores são realmente sensacionais.

Vamos falar agora sobre aquelas vezes em que o mundo conspira contra você. Quando tudo o que pode dar errado acontece.

1) Você não recebe o contrato. Há a promessa do editor, mas o papel não chega. A explicação é bem simples. O editor sabe que terá dois anos para estar com o livro pronto a partir da assinatura do contrato. Só isso. O cronograma da editora pode estar atrasado e esse é um dos recursos que algumas utilizam. E agora? Bem, você pode esperar ou mandar o texto para outra casa editorial. Se optar pela segunda opção, avise antes.

2) Há contratos que não tem como único objetivo a edição de livros (Hã? Como não?!). Tem editoras que parecem empresariar os escritores, pedindo porcentagens absurdas caso a história vá para o teatro, TV ou cinema, mas que não fazem nada para que isso aconteça. Procure negociar. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Tome o mesmo cuidado com a publicação no exterior. A cessão exclusiva dos direitos de publicação fora do Brasil não fará sentido se isso for um trabalho que a editora não realiza.

3) Você não ganhará 10% do preço de venda. Algumas editoras pagam 8% para que o ilustrador receba os outros 2%. É um assunto que gera controvérsias. Eu, por exemplo, acho muito justo que o ilustrador ganhe sua parte em DAs, mas tal quantia poderia ser retirada de outro lugar. No entanto, esses valores são comuns. Fique de olho em editoras que oferecem menos de 8% para o escritor. Algumas nem repassam os 2% para o ilustrador.

4) Já vi editora oferecer 10% de Direitos Autorais para e-books. Vi outra oferecer 30%. É um mercado novo e estão todos ainda se adaptando. Vale tentar negociar.

5) A editora não parece levar em consideração a indicação de ilustrador pelo escritor. Isso é suuuuper comum. Muitas vezes o ilustrador indicado custa mais caro do que a editora pode pagar. Em outras, o editor de arte sugere outro artista que tenha mais a ver com o texto. Aceite. Claro, a menos que você não goste nem um pouco do traço deste.

6) O escritor não recebe o texto revisado para aprovação. Absurdo total! Ligue e brigue. Se não receber os rascunhos das ilustrações, ligue e reclame. É menos grave do que o primeiro, mas não é nada educado também. Aliás, lembre o editor de enviar o texto revisado com antecedência. É comum o envio do arquivo na véspera de mandá-lo para a gráfica, dando ao escritor um prazo curtíssimo para a aprovação final.
7) A editora não inscreve seu livro em nenhum programa de compra de governo. Isso é muito ruim. Hoje o Governo compra mais de 60% de todos os livros de literatura infantojuvenil publicados no país. É bom lembrar a editora de inscrever seu livro no PNBE, PNLD, PNAIC e outros.

8) A editora não marca nenhuma entrevista ou encontro. Chato isso, não é? Tem coisas que ninguém faz melhor do que a gente mesmo.

9) Os Direitos Autorais não são depositados. Os relatórios não chegam. Converse com a editora. Pode ser alguma falha na comunicação. Se isso não adiantar, arrume um advogado.

Como vê, o dia seguinte pode ser o céu ou o inferno. Boa sorte. :-)

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